Indicação polêmica de Zanin ao STF pode enfrentar obstáculos com base em precedente do caso Ramagem
Especialistas em direito questionam nomeação de advogado pessoal de Lula para a Suprema Corte
A indicação de Cristiano Zanin, advogado pessoal do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT), ao Supremo Tribunal Federal (STF) está suscitando questionamentos e pode ser judicializada, assim como ocorreu com a nomeação do delegado Alexandre Ramagem para a chefia da Polícia Federal durante o governo de Jair Bolsonaro. A nomeação de Ramagem foi barrada pelo ministro Alexandre de Moraes, que acatou um pedido do PDT, levando em consideração alegações de ingerência política na PF.
O ministro Moraes argumentou na época que a substituição realizada por Bolsonaro caracterizava um "desvio de finalidade" do ato presidencial, violando os princípios constitucionais de impessoalidade, moralidade e interesse público. O magistrado também invocou os princípios da moralidade administrativa, impessoalidade pública e interesse coletivo para suspender a nomeação.
Caso o mesmo princípio seja aplicado à nomeação de Zanin, Lula terá que escolher outro jurista para ocupar a vaga no STF. Como Zanin atuou como advogado de defesa do ex-presidente em processos da Lava Jato, há argumentos de que sua nomeação poderia configurar um impedimento, devido ao vínculo advocatício anterior.
Segundo o especialista em direito administrativo Amauri Saad, ao nomear seu próprio advogado, Lula estaria admitindo que sua verdadeira motivação para a indicação ao STF não condiz com os requisitos estabelecidos por Moraes para a nomeação de um agente público. Saad ressalta que o presidente mencionou que a nomeação para o STF era "assunto seu" e demonstrou confiança em Zanin devido à sua atuação como seu advogado pessoal nos processos criminais em que foi réu.
De acordo com Saad, é improvável que o STF adote a mesma rigidez com a atual nomeação, uma vez que o presidente em exercício não é considerado um inimigo da corte, mas um aliado.
O requisito de "notável saber jurídico" para ocupar o cargo de ministro do STF também é destacado por Ângela Gandra, professora de Filosofia do Direito e presidente do Instituto Ives Gandra. Ela explica que, além de critérios como amizade e confiança, a nomeação deve seguir os pressupostos constitucionais. Gandra argumenta que a indicação de Zanin poderia ser comparada à suspensão da nomeação de Alexandre Ramagem, pois ambos os casos envolvem a escolha pessoalista e a possível não observância dos critérios constitucionais.
A Transparência Internacional também criticou a nomeação de Zanin, afirmando que vai contra os compromissos assumidos pelo Brasil em relação à independência do Judiciário. A organização destacou que a indicação parece transformar o tribunal em um "anexo do governo de ocasião" e alertou sobre o enfraquecimento e captura das instituições democráticas do país.
Além disso, mais de 5 mil advogados manifestaram seu descontentamento com a indicação de Zanin. Em uma carta aberta, eles pediram ao Senado Federal que rejeite o candidato, caso seja oficialmente indicado pelo presidente Lula. Os advogados argumentam que a escolha para o STF deve ir além de meros requisitos técnicos, enfatizando que a nomeação deve ser política e estar alinhada com os princípios de justiça e moralidade da República.
A nomeação de Zanin continua sendo alvo de controvérsias e o debate sobre a composição do Supremo Tribunal Federal e a independência do Judiciário no Brasil segue em pauta, exigindo um amplo debate por parte da sociedade e dos representantes eleitos no Senado.