Saúde

Isolamento e desemprego aumentam dependência química na pandemia

Traumas, vulnerabilidade social e mudanças de rotina estão na raiz da alta de consumo excessivo de drogas durante crise sanitária no Brasil; mortes ligadas ao abuso de álcool cresceram

Por Reprodução Estadão

13/09/2021 às 10:26:13 - Atualizado há

Marcelo enterrou a mãe em meio à pandemia de covid-19. Quinze dias depois, foi a vez de um irmão. Mais duas semanas, outro irmão. De luto, descontou no álcool. Para Lívio, pesaram o isolamento social e as incertezas diante de um vírus desconhecido. Também passou a beber de domingo a domingo. Já Filipe ficou sem emprego, voltou à cocaína e acabou indo morar na rua. Agora, busca reabilitação: "Cansei de só sobreviver, quero voltar à vida."

Em agosto, o Estadão foi a duas comunidades terapêuticas e uma república, mantidas pelo governo de São Paulo, para contar histórias de quem perdeu o controle durante a crise sanitária, abusou das drogas e hoje tenta retomar a autonomia sobre a própria vida. As unidades prestam assistência a dependentes químicos no Estado. Para preservar os acolhidos, todos os nomes usados são fictícios.

Trauma, perda de renda, mudança brusca de rotina e situações de vulnerabilidade social estão na raiz do consumo compulsivo de álcool e de outras substâncias, segundo relatam psicólogos, pesquisadores e assistentes sociais. "A gente percebe esse aumento até pelo número de ligações e mensagens recebidas nas redes sociais", comenta Denis Munhol, coordenador de uma das unidades visitadas pela reportagem.

Estudos recentes e dados oficiais endossam a percepção de que o problema se agravou no Brasil e em outras partes do mundo. Em 2020, as mortes relacionadas a "transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool" subiram 23,9% no País, segundo levantamento no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde.



Ao todo, houve registro de 8 mil óbitos, ante 6.445 notificações em 2019. É a maior alta observada ao menos desde 2008. A análise dos dados mostra, ainda, que o crescimento foi mais acentuado a partir de abril, data que coincide com a proliferação da covid e os decretos de quarentena pelos Estados.

Paralelamente, uma pesquisa da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), divulgada em novembro, apontou que 42% dos brasileiros relataram maior consumo de álcool na pandemia. Feito com 3.799 entrevistados, o estudo ainda indicou que a chance de beber com mais frequência subiu 73% por causa de quadros graves de ansiedade.


Outra pesquisa recém-publicada, da Unifesp, estima que um a cada quatro idosos no País consome álcool, com mais prevalência entre homens e pessoas de maior escolaridade. Para 3,8% dos 5,4 mil participantes, a quantidade que ingere em uma semana típica pode colocar sua saúde em risco.

Em nota, o Ministério da Saúde afirma que os dados de mortes por álcool são "preocupantes", mas que "não há como fazer inferências de correlações, ou mesmo de causalidade, utilizando um único indicador" em relação à pandemia. "Cabe esclarecer que a mortalidade é um indicador distal, ou seja, pode ocorrer após anos de uma causa, como o aumento de consumo", diz.

A pasta também afirma ter "ações permanentes para o entendimento do problema" e que os Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps), unidades especializadas em transtornos, oferecem atendimento a todas as faixas etárias. Segundo o comunicado, as unidades atuam sob "a ótica interdisciplinar seja em situações de crise ou nos processos de reabilitação psicossocial".


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